sábado, 21 de fevereiro de 2015

Recarregando e andando

Fonte: Korean-Mashinery

  Sobre a tecnologia de recarga contínua para veículos em movimento, de que já falei aqui, alguns modelos já estão bem definidos e vários pilotos já funcionam principalmente na Coreia. A Kaist OLEV Technologies apresentou o modelo que está em uso, nele o veículo fica no centro de uma extensão de cinqüenta metros de pista, em que os indutores funcionam e mandam energia, quem sabe até dados, não seria complicado incluir isso. Enquanto ele avança, os que ficam para trás se desligam e os próximos são acionados, mais ou menos como se houvesse um ressonador seguindo o veículo.

Fonte: Spectrum
  A eficiência média de 80% do início da tecnologia, em 2010, já chega aos 85%, chegando a 90% com o veículo parado, em um semáforo por exemplo. Muitas redes de energia não conseguem essa eficiência, muito menos as de longa distância, que chegam a perder mais da metade do que transmitem.

  Uma das vantagens operacionais mais exploradas é poder reduzir em 80% o volume de baterias à bordo, aliviando e barateando o veículo, melhorando o desempenho urbano e até o conforto, já que a suspensão pode ser mais macia. O princípio de funcionamento é a indução, o mesmo das bobinas automotivas, só que em vez de (apenas) alterar a tensão, há transferência de energia. Talvez até a recarga de aparelhos portáteis à bordo seja viável, quem sabe.

  Mas a maior argumentação é a segurança. Não há fios e conectores para gerar faísca, nem mesmo a infiltração de água no asfalto causaria risco de eletrocussão. Também há a redução drástica de custos, pois toda a estrutura seria muito mais simples e fácil de substituir. No caso dos trens, se eliminariam os suportes para a fiação aérea, eliminando um dos pontos fracos dos trens eléctricos, em caso de colisão automotiva, furacão ou terremoto. Seria praticamente o fim da interrupção acidental de energia para as linhas, tanto nos trens quanto nos ônibus. Quando essa tecnologia se estender à iluminação pública, diremos adeus às limitações de arborização urbana, já que os galhos não serão mais uma ameaça à transmissão de energia.

A instalação. Fonte: The Detroit Bureau

  Há cinco anos a expectativa era de poder transmitir 35kWh, na prática a taxa é de 100kWh. Se a tecnologia parasse de evoluir hoje, já seria algo interessante. Por incrível que pareça, também há brasileiros trabalhando e obtendo bons resultados em projectos do gênero. Clique aqui e veja. Isso significa que podemos esperar por estradas de recarga contínua no Brasil? Não tão cedo. Ciência e política nunca foram amigas íntimas, por aqui elas são inimigas ferozes... A não ser que o escândalo da Petrobras dê os frutos que precisa dar, então até a absurda alíquota de mais de 46% de IPI para eléctricos plug-in seria eliminada.

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Ford Comuta - Quando os eléctricos sonhavam pequeno


  Literalmente pequeno. Em 1967 a Ford inglesa dançou conforme a música, ficou bonito, mas justo por isso acabou sendo apenas uma coreographia estéril, como as de programas de auditório. A idéia era de um carro urbano para duas pessoas, percursos curtos, como de casa para o trabalho, onde ele seria recarregado na rede da empresa.

  Só que o conceito não era para quem não dispusesse de outro carro para a família, seu desenho nem mesmo inspirava confiança ou mesmo respeito por parte do consumidor. Até o Henney Kilowatt era mais exequível, mesmo sendo um Dauphine adaptado, tinha quatro lugares e um porta-malas.

  O Ford Comuta era um caixotinho de dois lugares, com a frente inspirada nos filmes de ficção científica dos anos sessenta, a frente e o conceito, mas as baterias da época o tornaram apenas um brinquedo para ser admirado em photos de revistas e exposições em salões do automóvel. Isso em uma época em que as montadoras faziam conceitos enormes, com aparência de naves espaciais, remetendo ao desempenho e à liberdade de um alcance continental, com todo o espaço interno e conforto que um carrinho urbano não pode oferecer.

  O apelo do conceito era de praticidade e racionalidade, que caem por terra quando nos lembramos de que não vivemos em um mundo bom, muito menos perfeito. Mudanças de trajeto podem ser necessárias, picos de aceleração e rampas íngremes podem se tornar comuns de vez em quando, até mesmo uma saída de emergência para o hospital pode ser necessária e as baterias talvez não tenham conseguido carga suficiente, porque em carros pequenos da época eram poucas e assim davam pouco alcance, para aliviar, poupar espaço e baratear a construção.

  Sua velocidade máxima era de 60km/h, mas só deveria ser utilizada em trechos ou para ultrapassar ônibus e caminhões. A autonomia equalizada era conseguida a 40km/h, não passava de 60km/h com uma carga de sua bateria de 12V. Se for pensar que qualquer motoneta pequena, a 40km/h, roda duas horas sem recarga, mesmo com baterias de chumbo, ele fica ainda mais parecido com um brinquedo. A 60 por hora, provavelmente não teria muito mais do que meia hora de autonomia, e com o conhecido risco de a bateria ter suas placas de chumbo irreversivelmente danificadas.


  Decerto que a Ford não tinha muitas esperanças de o público pedir para fabricarem o carro, mas a deficiência dinâmica era gritante. O clássico Mini levava quatro ocupantes em horas de viagem sem precisar reabastecer, a mais de 100km/h. E era um carro tão barato e tão básico, que nem máquina de vidro ele tinha, era tudo corrediço, como na antiga Kombi. Em larga escala, o preço do Comuta não seria tão menor que justificasse a escolha, provavelmente nem seria significativamente menor.


  Infelizmente essa visão de um carrinho de brinquedo extra grande para levar dois ou quatro adultos a um passeio curto, perdurou até o início do século. Quem não se lembra do Reva, que chegou a rodar no Brasil e, na época, cobrava quase cem mil reais para rodar 80km a não mais do que 80km/h? Até a Tesla lançar o Roadster, montado em cima do Lotus Elise, (hoje serve de base para o retorno da Detroit Electric) que rodava 250km a mais de 100km/h. Era um esportivo caro, mas quebrou o paradigma de carrinho pequeno, lento e de baixo alcance para ficar mais barato.


Hoje a história seria outra, baterias alcalinas leves e com relação preço/potência próximos à das arcaicas chumbo-ácidas, ele poderia rodar uma hora a 120km/h sem acrescentar um centímetro sequer às suas dimensões. O problema é que na época se pensava muito pequeno para as baterias, ninguém se arriscou sequer a oferecer leasing de versões eléctricas de seus carros grandes, para firmas de entregas e transporte escolar; isto sim, teria dado algum fruto.

Ford Taunus 1964

  Havia ainda uma opção que não passou pelas mentes da engenharia. Se tivessem apostado na receita do Smart, de se ter um Mercedes-Benz de bolso, com potência, acabamento interno e conforto que justifiquem o preço, provavelmente 36V alimentariam um motor bem mais potente e com alcance para atravessar a cidade sem medo, mas a mentalidade na época era equiparar o preço ao tamanho do carro. Se ao menos tivessem "modernizado" um Ford Taunus e apresentado como um conceito, lá sim, caberiam uns 120V para rodar 120 ou 150km, o que já o tornaria realmente prático. Mas pensaram pequeno.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

BYD - A vez de Goiânia

  Finalmente um veículo eléctrico de fábrica desembarca na cidade. A BYD incluiu Goiânia no circuito de testes de seu já consagrado ônibus eléctrico K9. A notícia saiu daqui. Para quem tinha dúvidas das intenções dos chineses, eis a prova contra seu ceticismo.

  O ônibus será testado por trinta dias na linha 025 Terminal Bandeiras / Avenida t-63 / Terminal Isidória. Para quem não conhece a cidade, trata-se de um dos percursos mais longos, travados e com asfalto mais castigado da cidade, no qual os veículos freiam muito bruscamente e aceleram tão quanto. Curvas fechadas e motoristas folgados estacionados em cima da esquina, são praticamente a regra. É um teste de resistência que será feito quatorze vezes por dia, com  usuários acostumados a maus tratos e rudeza.

  Embora seja fácil ser melhor do que os caminhões encaroçados que usamos, o K9 tem suspensão macia, piso mais baixo, um acabamento bem feito, sem parafusos expostos e conta com o providencial ar condicionado, muito bem-vindo em uma cidade com pontos que ultrapassam fácil os 40°C, com sensação térmica acentuada pela alta umidade. Isso fora o silêncio interno, para quem está acostumado a sair quase surdo do veículo, principalmente os motoristas sortudos que foram escalados para dirigir o K9. Também a ausência de descarga, pelo que os pedestres agradecem assaz.

  Até agora a aprovação tem sido unânime, principalmente porque o ônibus com baterias de phosphato de ferro será nacional. O porém é que baterias ainda são caras, embora a reciclagem crescente vá resolver isso a médio prazo, mas ele conta com manutenção mínima e esporádica, o que resulta também em seguro mais baixo, fora o custo operacional muito menor, especialmente após a alta escorchante do diesel.

  Ainda não vi o dito cujo, mas espero conseguir andar nele em breve, antes que os testes terminem. Fico então devendo as impressões pessoais.