terça-feira, 15 de março de 2022

A chance de ouro que estão desperdiçando.

 

JAC iEV20


Apesar dos aumentos ultrajantes da energia eléctrica, os obesos preços dos combustíveis têm pesado mais a favor dos veículos eléctricos. As queixas de motoristas de aplicativos, bem como as dos usuários, são crescentes e o abandono do negócio já ameaça a modalidade, porque os táxis já estão se tornando mais vantajosos, justo o argumento que os aplicativos tinham para atrair clientes. Infelizmente os eléctricos e híbridos ainda são muito caros para a maioria, apesar de alguns incentivos já vigentes, e substancialmente caros para o que oferecem em relação aos carros à combustão interna, o que infelizmente ainda vai demorar bastante a se resolver, especialmente com essa guerra estúrdia complicando tudo. Isso não significa, porém, que não haja uma saída, embora no Brasil ainda em poucas cidades. Muita gente aluga os veículos de trabalho, desde motocicletas até caminhões e ônibus, então é perfeitamente possível nas principais metrópoles do Brasil recorrer a esse expediente para contornar a crise, pode-se simplesmente alugar um plug-in para trabalhar.

 

Não é um bicho de sete cabeças e alguns taxistas já até compraram os seus, tendo eles relatado a satisfatória redução dos custos inerentes à profissão. Alugar, ou assinar como está na moda, então seria até uma porta de entrada para aquisições futuras, como o são os aluguéis de carros de luxo para eventos. O problema é que essa modalidade para eléctricos está quase que exclusivamente concentrada no eixo Rio – São Paulo, justo onde está concentrada a infraestrutura de praticamente tudo neste país, e desconheço quem alugue motocicletas e caminhões eléctricos. Talvez o desenrolar dessa crise dentro de uma crise que já estava dentro de outra crise gere a demanda necessária, tomara, mas isso depende do consumidor.

 

Vamos então à parte boa dessa história medonha. Tanto entregadores quanto condutores, sejam autônomos, taxistas ou aplicativos, rodam muitas horas quase ininterruptamente, sempre em velocidades moderadas e usando bastante os freios; aqui uma bronca aos motoristas em geral e às autoescolas, que negligenciam MUITO o treinamento e uso do freio motor, que pode evitar a maioria dos acidentes por travamento das rodas. Essas características de rodagem, velocidade e uso dos freios é perfeita para quem tem um eléctrico, a maioria absoluta deles tem frenagem regenerativa, que bem utilizada garante algumas horas a mais de autonomia. Não obstante esse recurso, e os valores da diária ainda serem compatíveis com os pares à combustão, o consumo de energia das baterias é irrisório quando se estiver preso em congestionamentos. Um Golf por exemplo pode ser alugado por menos de R$400,00 por dia, a assinatura mensal de um Zoe sai por cerca de R$3890,00; menos de R$110,00 por dia. Há o caso de um motorista de aplicativo que pegou um JAC iEV20 e agora está rindo para as paredes.

 

Decerto que os carros modernos já são muito silenciados (vai tirar aquelas centenas de quilos de material acústico para ver) mas a experiência da clientela que prefere ser conduzida a dirigir, a mais exigente, será muito melhor, a ponto de talvez até precisar ser avisada de que chegou ao destino. Um motorista de aplicativo roda em média 3000 km por mês, ou 100 km por dia, que é um terço da autonomia da maioria dos eléctricos puros à venda no Brasil. Isso daria dez recargas completas por mês. Em Goiás o kWh custa no máximo R$0,60, a bateria do Zoe acumula 52kW, então uma recarga completa custaria aqui R$31,20 para rodar até 380 km. Então as dez recargas mensais custariam R$321,00, dando e sobrando para a rodagem média de taxistas e aplicativos. Quanto vocês gastam mesmo por mês em combustível? Sem contar que o eventual radiador das baterias não vai ferver.

 

O progresso desse negócio pode vir a beneficiar também os entregadores, porque a motoquinhas eléctricas mais simples e baratas, que nem rezando rodam mais do que 70 km com uma carga, custam mais de R$10.000,00. Um motoboy pode rodar 250 km por dia, o que exigiria quatro recargas diárias das scooters mais simples, o que é impraticável para um profissional. Isso obriga os profissionais a escolherem modelos mais sofisticados e caros, ainda assim sem autonomia para toda a jornada com uma só carga. A solução seria alugar também baterias extras que, pelo amor de Deus, guardadas para recarregar em local seguro, garantiriam o alcance necessário e poderiam ser levaras para casa no final da jornada. Só que baterias são a parte mais cara de um plug-in então vocês entenderam a necessidade do negócio de aluguel e assinatura para nossas paisagens realmente serem recheadas por veículos eléctricos.

 

Agora a parte mais potencialmente rentável e menosprezada por locadoras e serviços de assinatura automotiva.

 

Não menos importante, até porque eles carregam o Brasil nas costas, os caminhoneiros e frotistas urbanos e intermunicipais teriam um ganho excepcional de rentabilidade. Até o momento nós só contamos com três modelos plug-in no Brasil, o consagrado E-Delivery da Volks Wagen e a dupla da BYD; eT7 e eT18. Infelizmente não me consta de haver assinatura ou aluguel de nenhum deles, então ainda ficam restritos a companhias de médio porte para cima. Os BYD eT7 e eT18 atingem suficientes 85 e 95 km/h, que é um desempenho normal para caminhões, ambos prometem pelo menos 200km de autonomia. O E-Delivery, em ambas as versões 11 e 14, promete rodar 250km, com a vantagem de ter uma rede concessionária incomparavelmente maior para qualquer eventualidade. Em todos os casos a autonomia varia muito com a carga, que pode facilmente ser maior do que o peso do caminhão, mas seguramente uma recarga pode ser necessária todos os dias.

 

A BYD também tem um furgão, que também nadaria de braçada se fosse alugável ou assinável, com bons 300 km de autonomia, suficientes pra a maioria dos trajetos diários. O T3 chegou a vender 83 unidades em Junho de 2021, o que o tornou o plug-in mais emplacado de então, mais do que qualquer hatch plug-in “popular”. Vejam bem, ele vendeu! Não foi locação, foi venda, transferência de propriedade e ônus. Se uma locadora se interessasse, até Goiânia teria alguns deles rodando e sacolejando em suas ruas esburacadas.

A Citroën tem muito discretamente, até demais para o meu gosto, o E-Jumpy, que pode ser considerado um esportivo da categoria com máxima de 130 km/h, o alcance de 330 km pode bem ser suficiente para um dia de trabalho; estão dormindo no ponto, franceses! A rede concessionária cobre praticamente todo o Brasil e quase ninguém tem conhecimento dessa versão, que é praticamente a mesma E-Expert oferecida pela Peugeot, parte do mesmo grupo. A Master E-tech da Renault se contenta com acanhados 185 km de autonomia, mas não tão baixa quanto os parcos 76cv; na certa a Renault está apostando no preço e na proposta estritamente urbana como mote. Em todo caso, as francesas estão bem atrasadas em relação à chinesa.

Com bons 250 km de autonomia, A Fiat é a que mais desperdiça o potencial de sua rede concessionária, porque menos gente ainda sabe que a Ducato Elétrica existe. Sim, o nome é só isso mesmo, sem firulas, simplório, quase que lançada a contragosto. Imaginem a rede de autorizadas Fiat oferecendo pelo país inteiro, assinaturas dessa van! Bons de lábia como são os vendedores da marca, venderia como água

 

Em suma, uma oportunidade totalmente desperdiçada de tirar o pé da lama, senhores locadores. Mercado existe, parte do marketing eu já estou fazendo. Mexam-se!

 

Locadoras de carros eléctricos aquiaqui, aquiaqui,  e aqui.

Motos eléctricas à venda no Brasil, aqui.

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quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Tata Altroz EV - A Índia não está brincando!

 



                  Mais conhecida pelo fiasco do Nano, que foi mais um erro de estratégia do que de projecto, a Tata motors é uma corporação nos moldes da Hyundai, vai muito além da fabricação de carros, abrangendo praticamente todas as áreas de tecnologia pesada e fina. A imprensa esqueceu-se e não aproveitou o gancho do Nano para explorar o assunto, então tem muita gente por aqui que pensa que o conglomerado de Rastan Tata faliu, o que está mais longe da verdade do que cair pra cima. Se antes a Índia era conhecida pelos carros obsoletos e que não passariam nem nos testes de encosto, quanto mais de colisão, hoje a situação está mudando. Esses carros ainda existem, muito por pressão do mercado interno, mas mesmo neles a tecnologia está embarcando; o que é melhor, tecnologia totalmente made in India. Em fase final de desenvolvimento há inclusive uma eficiente bateria Alumínio-Ar (aqui) pela qual eles não terão que pagar royalties a ninguém. É uma gigante no multissetorial , como podem ver aqui.

 


O caso da Tata se reflete nos últimos lançamentos, cujos veículos conseguiram ter designs próprios, mostrando que eles estão fazendo a lição de casa melhor e mais rápido do que os chineses. Um exemplo é o hatch compacto Tata Altroz, em especial o Altroz EV, gerado no próprio centro de desenvolvimento da Tata. Visto de lado ele pouco difere dos concorrentes, mas logo chamam atenção as extremidades que lhe dão um ar de anos 1970, com tampas e lanternas avançando sobre o para-choque, o exacto oposto da tendência vigente, estilo que se tornou a identidade visual da marca até no pequeno Tiago (ver aqui) o carro de entrada da marca. Sem aquela salada de elementos que nos acostumamos a ver nos utilitários da Mahindra outrora montados aqui, o desenho é quase limpo e muito fluido. Quase porque a estamparia lateral é generosa e ajuda a fazer o carro parecer maior do que é, e mais esportivo do que é sua proposta. As versões a combustão têm três motores, um aspirado, um turbo e um diesel, e o governo indiano já começou com seu próprio pró-álcool para estimular a fabricação de bicombustíveis.

 


Bojudo, o espaço interno contrasta com os populares mais comuns na índia, três adultos podem realmente conviver em paz no banco traseiro. A silhueta alta permite que os assentos também sejam altos, liberando espaço horizontal para as pernas. A forração interna na versão de entrada é austera, mas não pobre, com tecidos e plásticos desenhados para fazer os ocupantes se lembrarem do aspecto externo. Os compradores elogiam esse conforto e sua boa adequação à condução prolongada, comum em países extensos como a Índia e o Brasil, mas pouco conhecida por motoristas europeus. O pacote de segurança é básico, mas anos-luz à frente do que reinava há até dez anos e ainda se encontra no país, e nem vê a concorrência chinesa pelo retrovisor, cairia nas graças até mesmo do mercado americano, inclusive porque ainda não há reclamações contra a confiabilidade mecânica. Ao contrário do que acontece muito em países “em desenvolvimento”, a Tata e a Mahindra têm lançado productos que estão realmente prontos para a venda, sem a pressa de lançar rápido para ganhar mercado e depois vemos o que fazemos com os processos.

 


O Altroz XE a gasolina, que parte de 5.84.900 rúpias, cerca de 41.000 reais, é a versão de entrada. O mais caro é o XZ+ diesel, parte de 9.59.400, cerca de 68.500 reais. Por dentro ele surpreende pela limpeza, mesmo tendo um painel com tudo o que um carro moderno exige, com aquela central multimídia espetada no tablier e um painel de instrumentos enxuto atrás do volante. O caso que nos interessa aqui é o do Altroz EV, que começa em 14.00.000 rúpias, por volta de 100.000 reais no varejo indiano. A primeira coisa que se pergunta é se um plug in puro de um país com pouca tradição no ramo, o que é uma premissa falsa, consegue rodar mais de 200km por carga. A Tata promete até 500km por carga por um carrinho que, se fosse importado, nos custaria cerca de R$ 250.000,00 posto que não temos um acordo com a Índia como temos com o México. Na prática, em condições reais de uso com um motorista real o utilizando, ele roda algo entre 425 e 450km com uma carga. Antes se falava em 300km com os 30kW de baterias então anunciados, mas a Tata decidiu ser mais agressiva em sua oferta, falam em 44,9kW.

 


Ainda não há dados oficiais de aceleração e velocidade máxima, podemos ter por base os Altroz aspirados que chegam fácil a 160km/h. A aceleração do EV é informada apenas como abaixo de 10 segundos, algumas fontes falam em nove segundos. A potência esperada é de 129cv e 24,9kgfm, dados que estão longe de serem empolgantes, mas fazem um bom serviço em qualquer via de rodagem. Vamos ver então, temos uma autonomia comparável à dos carros a combustão, mas com desempenho apenas bom, sem pretensões esportivas, largo (1754mm) alto (1505mm) e curto (3988mm) com um entreeixos de bons 2501mm; então temos o público do Altroz EV, pessoas com muitos amigos ou família para transportar. Claro que 24,9 quilos instantâneos em um carro pequeno darão momentos de boa diversão, mas o foco da Tata é outro, desviar-se do apelo de superesportivo que tem tomado conta de quase todos os anúncios de carros eléctricos. Com toda essa força a partir de 0rpm ele pode ser capaz de vencer rampas muito íngremes com carga total, sem parecer que vai descer de ré. Como já disse, com esses números ele agradaria até os americanos, pois não teria medo dos enormes trailers com que eles gostam de viajar e trabalhar.

 


Não só o EV, mas toda a gama da família Altroz parece ter sido pensada para ocupar o vácuo do Maruti Suzuki Swift, versão dos anos 1990 ainda fabricada por lá, que em breve não atenderá mais às normas de emissões e segurança, ao passo que o Tata, em testes de colisão, deixou o consagrado VW Polo para trás por 5 a 4 estelas. Se fosse fabricado no Brasil, daria muito trabalho à concorrência.

 


Mais sobre o Altroz:

 

Tata Altroz 2021 with iTurbo - Explore Altroz Reviews, Features & More (tatamotors.com)

 

Everything we know about the Tata Altroz EV (Mar 2021 update) (electricvehicleweb.in)

 

Tata Altroz EV could get 500 km range? | Shifting-Gears

 

Tata Altroz Videos: Reviews Videos by Experts, Test Drive, Comparison (cardekho.com)

 

                    Tata Altroz EV Price, Images, Reviews and Specs | Autocar India


(

quarta-feira, 4 de agosto de 2021

Um concorrente para o Zöe, mas nem tanto.

 

Tão diferentes que nem deveriam estar na mesma categoria.


Finalmente a Fiat trouxe o Cinqüecento eléctrico, mirando em cheio o veterano Renault Zöe, agora com sobrenome E-Tech. Mesmo para um mercado ainda restrito, o Zöe tem fãs desde o seu lançamento e já estava folgado com o quase monopólio de seu nicho, visto que o Nissan Leaf é d’outra categoria e foca outro público. Então o Renault finalmente tem um concorrente directo e à altura, certo? Não, não é bem assim. A Fiat, talvez muito influenciada pela Ferrari, aposta demais na grife e cobra o preço por isso. A diferença não é grande, mas as soluções práticas oferecidas preservam os compradores do francês. O Zöe começa com R$ 204.990 na versão Zen, para quem fizer questão de um pouco de requinte a versão Intense si por R$ 219.990. O Cinqüecento perde de cara nos R$ 239.9990 cobrados pela versão única. Outro pecado é ter apenas duas portas, contra as quatro do Renault. Isso somado à paleta de cores, mostra bem a que público a Fiat destina seu representante, que hoje é o mais caro da marca no Brasil, com isso também restringe mais a faixa etária dos compradores. A cores do Zöe são mais tradicionais, só o vermelho se destacando e muito na paleta.

 

O charme do antigo e minúsculo Fiat 500, que só levava duas pessoas, ainda é visto nas linhas do novo, não se pode negar isso, mas “charme” retrô o New Beetle também tinha e nem de longe era o que se espera de um Fusca, então o chamariz pode não durar muito mais do que um test drive. Essa tendência identitária se repete no interior, com o tablier e o painel de instrumentos ainda remetendo ao clássico Tota, mesmo com aquela central multimídia que mais parece um tablet adaptado; Que besteira fez a Mercedes-Benz! O acabamento interno não decepciona, a quantidade de conveniências modernas também condize com o preço, mas fica claro que apesar de ter crescido um pouquinho, não é carro para uso familiar, nem para quem precisa transportar idosos ou portadores de deficiência.

 

O desenho quase futurista do Zöe ainda agrada muito e marcou de tal forma, que hoje influencia toda a linha Renault, tem personalidade própria, sem apelar para uma frente agressiva com uma grade desnecessariamente grande, mas que ainda assim é notada e faz a diferença no conjunto. O tablier também tem aquela central multimídia que não parece gostar muito do lugar em que está, também dá a impressão de que é um tablet adaptado, mas maior e em posição mais integrada ao conjunto. O painel de instrumentos é moderno, mas contido. O espaço interno maior e mais iluminado contrasta com o do pretenso concorrente, o que aliado às portas extras torna o francês mais apropriado a um casal com dois filhos não muito grandes. No porta-malas cabem as compras da família e até bagagens para uma viagem não muito arrojada. Seu estilo, mesmo não sendo tão cult quanto o do Fiat, lhe permite transitar com elegância do trabalho cotidiano para o shopping center.

 

É incoerente falar em robustez quando tratamos de dois carros feitos para o asfalto, cujas suspensões são calibradas para esportividade ou conforto, ainda mais considerando que as ruas sem calçamento não dispõe de estrutura para recarga, pelo menos no Brasil nem as estradas boas costumam ter. Em ambos os casos, se o motorista se aventurar até uma chácara ou uma fazenda, serão de longas oito a eternas doze horas na tomada doméstica para uma recarga completa, se não faltar luz, então sair da estrada não é para eles.

 

Os 118cv e 22,4kgfm do Cinqüecento-e o fazem acelerar de 0 a 100 em alegados 4,8s, a velocidade máxima é limitada a 150km/h. O Zöe E-Tech tem saudáveis 134cv e 25kgfm, mas a força é mais dosada, com a aceleração de 0 a 100 em comparativamente longos 9,5s e máxima contida nos 140km/h. O que parece ser um disparate, e a princípio é mesmo, se deve à política interna de cada montadora para preservar mais ou menos a autonomia, o que acentua a vocação mais familiar do Zöe. O motor do Zöe, sem essas restrições electrônicas, o fariam nem ver o Cinqüetento pelo retrovisor, e em uma adaptação faria até mesmo um Opala Diplomata fritar pneus, mas para o uso a que se destinam uma aceleração tão vigorosa não importante, principalmente porque ainda são poucos os pontos de recarga pelo país, até mesmo em São Paulo, então aqui a vitória do Fiat é muito apertada, porque com o carro cheio o motor do Renault mostraria quem realmente manda.

 

Falar de autonomia em um carro eléctrico é um problema pela polêmica envolvida. Vão-se longe os tempos em que revistas especializadas davam dados detalhados considerando várias faixas de velocidade, duas ou mais situações de carga e até mesmo diferenciando bem os testes em estrada dos em ciclos urbanos. Hoje temos uma padronização mais burocrática do que realmente técnica, que pode deixar o motorista em maus lençóis se não prestar atenção à carga da bateria, ou mesmo ao nível do tanque. O Cinqüecento-e promete bons 400km de autonomia, chegando a até 480 km com o pleno uso da regeneração por frenagem, o que é claro que só consegue levando apenas um motorista com peso moderado, em pista bem conservada, sem grandes aclives e velocidade racional; vai esperando, vai! O Zöe promete mais realistas 385km, que me fazem repetir as restrições já dadas, mas o motor mais torcudo é menos sensível à carga e às condições de rodagem. Na prática, um motorista experiente, que conheça bem o carro que conduz e ciente de que precisa chegar ao destino, não vai conseguir muito mais do que 360km em condições normais de rodagem, não importa qual esteja dirigindo, mas o Zöe vence por permitir isso com mais carga e menos restrições de rodagem, e pelos 388 litros do porta-malas. Os 185 litros do Cinqüecento são pouco mais do que o que o Fusca oferecia. Uma vez a Fiat soltou uma peça publicitária com janelas estreitas, alfinetando a Saveiro para dizer que uma janelinha atrás da porta não torna estendida uma cabine simples, pois aquela portinha traseira no lado direito do Cinqüecento-e merece a mesma crítica, de quebra é um componente a mais pra dar problema e permitir infiltrações.

 

Para convencer mais o comprador, a Renault alardeia haver 17kg de plásticos reciclados no interior do Zöe E-Tech, o que nem parece porque está mais refinado do que a versão anterior, um anúncio condizente com a proposta e o marketing dos eléctricos. A Fiat ainda bate na tecla da paixão por carros, talvez por isso tenha liberado mais desempenho para o Cinqüecento-e, que no modo econômico simplesmente não aparece. Apesar da má fama de que os franceses desfrutam no Brasil, vale lembrar que são ambos importados e a Fiat nunca foi muito feliz com importações, basta lembrar das dores de cabeça dadas pelos primeiros lotes do Tipo, entretanto a confiabilidade de um motor eléctrico sempre foi uma de suas grandes vantagens, então presumo que um condutor mediano só fica no caminho por falta de bateria, não por quebras.

 

Minha conclusão é que apesar de o Cinqüecento-e mirar com vontade o Zöe E-Tech, vai acertar outros alvos. Embora o comprador de um eléctrico ainda seja aquele que quer mesmo comprar um, mesmo pagando mais para rodar menos, os públicos de ambos são tão distintos quando os estilos dos carros, sendo o Zöe claramente apto a receber uma versão break e o 500 mais voltado para o lazer mesmo. Em um lampejo de racionalidade um comprador que não tenha preferência por marcas e não se importe com status, vai voltar para casa dirigindo um Zöe, principalmente se tiver família. Para quem quer brilhar em ambientes jovens e pagar mais pela diversão, o carro é o Cinqüecento-e.

sexta-feira, 30 de abril de 2021

Bye, Bye, querosene!

 

George Bye, from Forbes

O que deu popularidade ao carro eléctrico foi justamente o abandono das idéias utópicas de minicarros pelados, lerdos e com alcance insuficiente para as necessidades de uma família. Com todos os avanços que já tivemos, as baterias ainda são caras, pesadas e volumosas, características que só podem ser balanceadas a contento por veículos maiores, mas potentes e bem equipados; bom senso inaugurado pela Tesla e levada a termo por outras montadoras. Com os outros modais nãos seria diferente, em verdade é até mais dramático. Ferrovias demandam veículos extremamente potentes para percursos extremamente longos, puxando cargas extremamente pesadas. Hidrovias têm o agravante de não haver pontos de recarga e não haver possibilidade de electrificar trechos do oceano para mitigar o problema. Aerovias têm o ônus extra de que aviões sem anergia caem, simples assim. É por isso que não vemos um Boeing 747 com seis ou oito motores a hélice recarregando baterias no hangar de algum aeroporto, mas nem por isso outros modais estão parados no tempo. No caso da indústria aeronáutica os passos só são mais curtos do que a da automotiva. Além das iniciativas ousadas da Pipstrel, outras empresas estão trabalhando a sério e a americana Bye Aerospace buscou a maneira mais racional de concretizar a aviação executiva.

 

eFlyer 800

Usando a consagrada fuselagem do robusto bimotor King Air 260 para produzir o eFlyer 800, após se capitalizar e ganhar expertise com o pequenino e austero e-Flyer 2, todos os meios sérios de comunicação aeronáutica deram espaço à obra de George Bye. Os resultados são animadores, com cerca de 518 km/h de velocidade de cruzeiro e 926 km de alcance, mais 45 minutos de reserva; este é um padrão de segurança na aviação mundial. São quase duas horas de vôo a uma velocidade razoável para cobrir médias distâncias, que é o mais comum na aviação executiva. O problema de recarga continua, não dá para simplesmente fazer escalas de alguns minutos para reabastecer e cruzar os Estados Unidos em um dia. Seria planejar bem para chegar ao destino com uma boa carga de reserva, a fim de reduzir o tempo de recarga; mas marcar a reunião para a tarde e seguir viagem de manhã bem cedo ainda estaria em um bom plano de vôo. Para o empuxo são previstos de 50kW a 500kW, mas podem chegar a 1MW (1.360.000cv) de potência nos motores ENGYNeUS fornecidos pela Safran Electrical & Power. A altitude de 35.000 pés, pouco mais de 11km, não afetaria o funcionamento dos motores eléctricos, então a economia do ar rarefeito seria somada ao funcionamento inalterado do trem de força.

 

eFlyer 800

As grandes vantagens, entretanto, podem seduzir executivos que podem abrir mão de longos alcances e se dispõe a, eventualmente, fazer parte do trajeto emergencialmente com querosene. Pelo silêncio de seus motores, o eFlyer 800 pode sobrevoar áreas que um bimotor desse porte não poderia, em altitudes menos concorridas, agilizando as aterrissagens. Também por conta do silêncio, poderia utilizar essas mesmas rotas a qualquer hora da noite, sem que a vizinhança do aeroporto encomende um míssil terra-ar. Apesar de ser aconselhável ter um carregador apropriado, ainda seria possível deixar o avião a uma tomada de alta corrente, dispensando contractos com empresas de abastecimento e sem medo de querosene ruim prejudicar o desempenho. O único ruído seria o aerodinâmico que, asseguro, é uma fração do nível de ruído produzido por uma aeronave a combustão interna, isso o habilitaria a trabalhar até mesmo em uma eventual pista interna de um hospital. Já pensaram, sair directo da UTI aérea para a sala de cirurgia, sem translado terrestre e sem o risco de ficar preso no trânsito? Sem contar as vantagens da gritante simplicidade construtiva, que veremos a seguir.

 

King Air 260c ambulância aérea

O baixíssimo custo comparativo de manutenção pode compensar em muito o relativo baixo alcance e a notória demora para recarga de baterias tão potentes. Os padrões aeronáuticos de segurança demandam rotinas de manutenção severas e vistorias, que fariam o mais chato zé frizinho parecer um mecânico boca de porco. Todos os itens precisam ser checados não apenas diariamente, mas sempre antes de cada decolagem. Imagine abrir o capô de seu carro e vistoriar óleo, fluido refrigerante, fluido de freios e tensão das polias; depois olhar em baixo para verificar o estado dos eixos, pneus e sistema de escapamento; por fim girar a chave e verificar o funcionamento dinâmico te todos os sistemas para só então dar a partida e sair com o carro. Pois pilotos fazem isso com os aviões. Agora imagine a agilidade para decolagem, se o catatau de procedimentos for reduzido a algumas poucas páginas até mais simples de serem checadas. Poupar-se ia muito tempo, que com as menores restrições compensaria em parte a menor velocidade de cruzeiro.

 

King Air 260 e uma Renault Master, que seria dispensável


Na hora de fazer as revisões, a parte de empuxo seria quase brincadeira; apenas hélices, estatores, rotores, fiação e baterias! E o próprio processo de recarga daria aos mecânicos as condições gerais da alimentação. O avião voltaria aos céus muito rapidamente. O que pode levar semanas, dependendo do caso, poderia durar poucos dias, talvez nem isso. Então paga-se menos horas de manutenção, menos taxas de hangaragem, pagando-se menos por fretamento de aeronaves durante essa manutenção, enfim, uma lista interminável de contratempos e aborrecimentos aos quais os proprietários de aviões executivos estão expostos. Então vocês podem imaginar, e imaginariam certo, que aviões próprios poupam ao cidadão muito mais do que custam para comprar e manter. Se tu voas mais de vinte e cinco horas por mês, já pode cogitar a compra ou ao menos arrendamento de uma aeronave; o eFlyer 800 promete reduzir essa relação.


eFlyer 800

 O uso de uma aeronave confiável e consagrada para servir de base pode parecer um demérito aos olhos dos entusiastas do automobilismo, mas as regras aéreas são diferentes. O King Air 260 é do tipo de avião em que praticamente qualquer bom mecânico pode pôr suas mãos sem medo. Toda a estrutura é bem conhecida, seus aviônicos já não têm segredos e a oferta de peças de reposição permite boas horas de sono ao proprietário. Se precisar parar na oficina, não demora a voltar ao serviço. Não só isso, o facto de a estrutura já ser certificada está acelerando muito a certificação da versão eléctrica, o que vai reduzir os custos e pode tornar os preços de aquisição menos salgados, já que aqui eles estão na casa dos milhões de dólares; o King Air 260 de produção já parte de US$6.000.000,00.

 

eFlyer 2

Ainda há a escolha das baterias de lítio-enxofre como bônus. Embora caras, têm uma densidade energética de menos de 2 kg/kW. Também pesa o facto de o enxofre ser muito abundante, o que torna o eFlyer 800 menos vulnerável aos problemas já aventados do encarecimento das baterias, pelo excesso de demanda que está porvir. Sim, infelizmente a euforia e a cegueira ideológica ameaçam comprometer o desenvolvimento do mercado de plug-ins, e por isso mesmo decidi tratá-los explicitamente como uma excelente OPÇÃO de mobilidade e não como a salvação da humanidade, como os outros sites têm feito. Enfim, essas baterias são fornecidas pela britânica Oxis Energy, o que também é uma excelente notícia, as distâncias menores simplificam a logística do abastecimento e, principalmente, ser uma empresa sediada na Grã-Bretanha afasta boa parte dos fantasmas do desabastecimento, não só por conta da superdemanda que desponta no horizonte, mas também porque americanos e britânicos se entendem bem e não haverá represálias políticas e ideológicas à Bye Aerospace por divergências entre Biden e Johnson. Doravente a geopolítica deve ser considerada em qualquer empreendimento, e este tipo é dos mais vulneráveis.

 

Pode por 50MW, por favor

Para a aviação comercial regular ainda não há chances, mas quem sabe o desenvolvimento e a boa aceitação não incentiva a hibridação dos grandes jactos comerciais, e assim talvez possamos vê-los com um cabo na tomada enquanto os tanques são abastecidos; e quem sabe isso salva os garbosos quadrijatos, especialmente sua majestade dos ares, o Being 747… Boa sorte à iniciativa de Denver.

 

Site da Bye Aerospace 

Site da Safran

Site da Oxis

Mais notícias aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

Um vídeo rápido sobre o eFlyer 800:



               Alguns projectos que já voam:


sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Musk escolheu a India

 

Está pensando que eles são fracos, meu amigo?

            Ao contrário das adaptações claramente caseiras que predominam no Brasil, na Índia o grau de sofisticação das conversões chega a ser superior aos carros fabricados pelas nossas finadas montadoras de fora-de-série. Mesmo as numerosas adaptações caseiras, que recheiam canais de vídeos indianos, são demonstradas de forma clara e didática, muitas vezes da forma mais barata possível, encorajando os aspirantes e provando que ferramentas podem ser usadas com vantagens como motores veiculares; são versáteis, fáceis de encontrar, relativamente acessíveis, têm uma gama incrível de potências nominais e geralmente têm uma alta eficiência energética. Uma esmerilhadeira por exemplo, daria conta fácil de um subcompacto mais antigo; Celta, Mille, Ka de primeira geração, etc. Há muitos vídeos a respeito, basta digitar "ev convertion India" e a vastidão de escolhas vai deixar vocês boquiabertos.

 

            Sem medo de críticas e de opiniões alheias, os indianos se jogam de peito aberto e acumularam o conhecimento necessário, já saíram da fase experimental, a técnica migrou para as fábricas e os modelos a combustão interna já dividem linhas de montagem com os plug-in há algum tempo, em especial os da Tata, dona da Jaguar e da Land Rover… que estão debutando com sucesso no mundo dos eléctricos puros. Como eu costumo dizer, quem comprou Cherry QQ não deveria ter problemas em comprar Tata Nano. A própria tata já tem belos protótipos em andamento para a próxima geração como o Vision. Por agora o compacto Tigor EV é o sucesso plug-in da marca, acompanhado pelo SUV Nexon… e é derivado de um carro a combustão.

 

Tata Tigor EV

            E esqueçam aqueles designs sofríveis que mais apreciam gambiarras de várias décadas em uma plataforma do meio de século passado, eles estão caprichando mesmo! Embora aqueles monstrinhos carismáticos ainda caiam no gosto do indiano, está cada vez mais difícil diferenciar um desenho indiano de um europeu. A era dos eléctricos caros de brinquedo como o minúsculo e limitado Reva já se foi.

 

Tata Vision Concept

            Seguindo o impulso moral desses transformadores, a indústria de veículos eléctricos da Índia merece respeito, contando com uma gama impressionante (especialmente para quem ainda tem aquele estereótipo terceiromundista em mente) de veículos eléctricos, que vão desde pequenas scooters com motor de liquidificador, até motocicletas com desempenho suficiente para enfrentar as rodovias. Claro que também há carros eléctricos, mas lembremos que os indianos estão prosperando honestamente, sem violações humanitárias e geopolíticas, e sem manipulações sistemáticas do câmbio e de opiniões acadêmicas, por isso ainda estão eclodindo. E o mercado de motocicletas lá é muito, mas muito forte, e as condições de uso demandam que sejam também muito robustas e confiáveis. A Prana é um caso de design respeitável com autonomia não menos, são até 225 km com uma carga. Claro que no caso do Mahindra eVerito, é apenas o Logan de primeira geração fabricado localmente e adaptado de fábrica, mas isso a China faz há décadas e provou ser eficiente para um plug-in de custo comedido e com bons resultados.

 

Os indianos são reencarnacionistas, Logan renasceu como eVerito.

            O resultado disso é que as pessoas se interessam mais em estudar e se aperfeiçoar no ramo, com as startups puxando consigo a forte indústria de tecnologia fina do país, que fornece mais insumos para o desenvolvimento dessas actividades e assim alimentando o círculo virtuoso do desenvolvimento tecnológico. Eles já têm cabedal para manufaturas mais avançadas e o interesse do consumidor é crescente, o assunto não é mais tratado como novidade pela imprensa local. Embora se admirem, os indianos vêem aqueles veículos como parte da paisagem. Decerto que ainda há muito por fazer, e a transparência da democracia indiana permite que as pendências apareçam impunemente, mas a própria população indiana está fazendo seu dever de casa.

 

O racional urbano Mahindra Treo Zor

            Em paralelo, o Estado não faz tanta questão de atrapalhar, o que explica a facilidade com que as adaptações ganham as ruas e são sucedidas por outras mais aprimoradas, ou só mais estranhas mesmo. A infraestrutura tem sido levada a sério pelos indianos, desde o saneamento básico até o apoio à logística. Tudo isso incentiva e produz mão de obra capacitada, apta a entrar na linha de montagem sem precisar aprender tudo do zero, barateando e acelerando a implementação de uma planta industrial. Praticamente tudo pode ser fabricado quase que imediatamente em território indiano, então os desembaraços aduaneiros são uma preocupação e um custo a menos para quem decidir investir lá. E quando eu digo que é praticamente tudo, é praticamente tudo mesmo! Desde aqueles famosos incensos até microprocessadores e celulares completos. Eles não negam suas tradições ao abraçar a tecnologia de ponta… como o Japão.

 

            Em resumo, eles já estão prontos e andando com as próprias pernas, enquanto nós ainda sujamos fraldas no berço esplêndido. É por isso, entre outras coisas, que a Tesla se decidiu a abrir uma fábrica na Índia, não no Brasil.

 

Para mais:

 

- Mantis Electric 

- Prana

- Principais motocicletas 

- Mahindra Electric

- Tata 

- Tigor EV 

- Nexon EV 

- Comparativo Vespa X Bajaj 

- Babaj EV aqui e aqui.



segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Os 500 de Moscou

 


            Por que Putin respeitaria uma civilização ultraofensível, masoquista, que cultiva culpas patológicas e fala em democracia permitindo grupos fazerem apologia a ditaduras sob as máscaras de “activismo”? Digam-me qual a cidade com mais ônibus eléctricos do mundo… chutem… asseguro que a maioria absoluta de vocês errou. São Paulo tem 18, todos recentes, e é a maior frota do país; Amsterdã, orgulhosa de sua “consciência ecológica”, tem 164; Berlim, que já nem se reconhece mais, tem 200; A arrogante Paris tem 259; Londres tem 300, e é a maior frota da Europa, não russa. Moscou tem 500… quinhentos!

 


            São cem postos de recarga para as 36 rotas servidas, por enquanto, por meio milhar de ônibus modernos e bem desenhados. Essa renovação começou em 2018, com uma encomenda de cem ônibus da VAZ Group e cem da Kamaz. Os Kamaz agradaram mais e outros cem foram adquiridos em 2019, para este ano mais 400 foram encomendados; ou seja, serão seiscentos até o fim deste malogrado ano de 2020. Para 2021 serão mais 400, até o fim de 2023 serão 2300 ônibus eléctricos no que será então o transporte público sobre rodas mais limpo de todo o planeta.

 


            Como isso aconteceu? Enquanto discursos prolixos neopentecostais tentam legitimar o vandalismo e o ódio entre cidadãos, do lado de cá, na Rússia isso é crime, o próprio cidadão russo médio rejeita isso com rispidez. Moscou trabalhou em silêncio enquanto o ocidente mimizento



se escarificava e pedia desculpas a qualquer um que não fosse de seu meio. O resultado é que escrevo agora, um Estado onde a oposição não tenta destruir o próprio país, tornou o transporte público moscovita o mais invejável do mundo “ecológico” moderno. O Kamaz model 6282Electric Bus tem capacidade para 85 passageiros, tomadas USB, wifi, vagas para cadeirante e bicicleta, câmeras para auxiliar o motorista, o mesmo aliás trabalha em uma cabine que o separa dos passageiros, entre outras modernidades.

 


            Contrariando a velha tradição soviética, e o senso comum, de apostar sempre na força bruta para compensar a falta de tecnologia, o 6282 foi projectado com muito refinamento. Em vez das baratas, mas obsoletas, pesadas e volumosas baterias tracionárias de chumbo, ou as já tradicionais íons de lítio com sua boa relação custo/benefício, se valem das caras e eficientes baterias de titanato de lítio, as mesmas usadas pela Rimac. Embora sejam pacotes pequenos, que garantem não mais do que 70km de autonomia, eles justificam seu preço pela enorme capacidade de carga e descarga, podendo ir de 0 a 100% de carga em até quinze minutos, com a recarga podendo ser feita por via aérea, como nos trólebus; ou seja, eles podem rodar virtualmente para sempre. A parte mais inteligente foi utilizar pequenas porções do que há de melhor e valer-se de uma infraestrutura invejável para garantir que seja o suficiente, assim eles reduziram significativamente os custos e garantiram tanto a comodidade dos usuários quanto a longa vida útil do conjunto. Tudo isso em cima de um veículo de piso baixo, o sonho de todos os brasileiros sem carro próprio.

 


            É notável citar que essas montadoras são russas. Embora certamente haja influência tecnológica externa, simplesmente porque nada no mundo pode mais ser feito absolutamente sozinho, tudo foi desenvolvido lá dentro, e o 6282 não é o único modelo eléctrico deles. Em resumo, eles não dependem de países inimigos, ou falsos amigos, para fabricarem o que precisam. A capacidade manufatureira está em solo russo. Eles até podem importar, mas se for necessário fabricam até as telas sensíveis ao toque… ou até mesmo as baterias, já que a Rússia tem as maiores reservas de titânio do mundo… assim como o Brasil tem as maiores de nióbio… preciso desenhar?

 


            E foi assim, em silêncio, tendo apenas a imprensa especializada mais atenta por perto, que Moscou fez sozinha e em larga escala, o que os gritadores ecofinanceiros e os ideólogos neopentecostais não conseguem juntos com sua arrogância pseudo-humanitária.

Mais a respeito aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

A Namíbia é bem mais do que vocês pensam

 


            As pessoas na América e especialmente na Europa, porque é vizinha continental, têm uma visão muito deturpada da África, e nossa imprensa ajuda muito a atrapalhar. Esquecendo-se de que Egito, Marrocos, África do Sul e outros países bem mais desenvolvidos do que pensam estão lá, vendem unicamente a imagem daquele bebê que se rende à fome para ser devorado por abutres; e aquele bebê, para seu governo, sobreviveu. Uma busca por arquitetura e cinema na África já refresca muito as idéias, e dilapida seus preconceitos contra os africanos... e é claro que eu vou arrancar mais uma lasca. Sim, os africanos também dirigem carros eléctricos, clique aqui e aqui, e veja.



            Vamos à Namíbia, que para vocês pode ser um dos países mais insuspeitos para constar neste blog, mas que já tem uma empresa tecnológica (das tais start-ups) especializada em conversão veicular para tração eléctrica. E não se trata de gambiarra em que se usa o bloco do motor original como suporte para o eléctrico, baterias de carro que perdem a confiabilidade se debitarem mais de um terço da carga ou coisas assim. Utilizaram em uma valente Toyota Land Cruiser, descendente de nossa indestrutível Bandeirante, baterias de lítio-fosfato de ferro e um motor apropriadamente adaptado ao veículo batizado de e-Cruiser... não, não é dos mais criativos, mas o foco foi na funcionalidade. Como tudo o que é bem feito, não saiu barato, a conversão custou 35.000 Euros.

Axel Conrad e Madryn Cosburn, os pais da empreitada com seu e-Cruiser. Photo de Lisa Plank

            O pacote conta com razoáveis 28,8kW de baterias LiFePo4, que alimentam o motor de 45kW (61,2cv) e a picape roda de 80 a 100km com uma carga. Pouco para o uso moderno de um plug-in, mas suficiente para o uso urbano corporativo, ou até breves incursões nas savanas, em que o alto torque e a baixa velocidade constante deixam a e-Cruiser à vontade; trechos quase intransponíveis e nenhuma exigência de desempenho sempre foram o habitat da linhagem da Land Cruiser. Por fora só discretas faixas brancas com "e-Cruiser" e o logo inscritos chamam atenção, que nem é tanta atenção assim, sinalizando que a proposta ´[e séria e que haverá evolução, ao contrário de pirotecnias típicas de empresas caroneiras. Eles querem crescer.

            O projecto foi tão bem feito e bem executado, que foi notícia em praticamente todos os meios de comunicação da África, mas é claro que não veremos isso nos canais dos preconceituosos combatentes do preconceito. Aliás, a população negra não rejeitou o projecto só porque foi concebido e está sendo tocado por brancos. O preconceito, inclusive contra os eléctricos, é muito maior deste lado da cerca.

            Ver mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e o site da Electric Vehicles aqui. O facebook deles aqui.