segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Os 500 de Moscou

 


            Por que Putin respeitaria uma civilização ultraofensível, masoquista, que cultiva culpas patológicas e fala em democracia permitindo grupos fazerem apologia a ditaduras sob as máscaras de “activismo”? Digam-me qual a cidade com mais ônibus eléctricos do mundo… chutem… asseguro que a maioria absoluta de vocês errou. São Paulo tem 18, todos recentes, e é a maior frota do país; Amsterdã, orgulhosa de sua “consciência ecológica”, tem 164; Berlim, que já nem se reconhece mais, tem 200; A arrogante Paris tem 259; Londres tem 300, e é a maior frota da Europa, não russa. Moscou tem 500… quinhentos!

 


            São cem postos de recarga para as 36 rotas servidas, por enquanto, por meio milhar de ônibus modernos e bem desenhados. Essa renovação começou em 2018, com uma encomenda de cem ônibus da VAZ Group e cem da Kamaz. Os Kamaz agradaram mais e outros cem foram adquiridos em 2019, para este ano mais 400 foram encomendados; ou seja, serão seiscentos até o fim deste malogrado ano de 2020. Para 2021 serão mais 400, até o fim de 2023 serão 2300 ônibus eléctricos no que será então o transporte público sobre rodas mais limpo de todo o planeta.

 


            Como isso aconteceu? Enquanto discursos prolixos neopentecostais tentam legitimar o vandalismo e o ódio entre cidadãos, do lado de cá, na Rússia isso é crime, o próprio cidadão russo médio rejeita isso com rispidez. Moscou trabalhou em silêncio enquanto o ocidente mimizento



se escarificava e pedia desculpas a qualquer um que não fosse de seu meio. O resultado é que escrevo agora, um Estado onde a oposição não tenta destruir o próprio país, tornou o transporte público moscovita o mais invejável do mundo “ecológico” moderno. O Kamaz model 6282Electric Bus tem capacidade para 85 passageiros, tomadas USB, wifi, vagas para cadeirante e bicicleta, câmeras para auxiliar o motorista, o mesmo aliás trabalha em uma cabine que o separa dos passageiros, entre outras modernidades.

 


            Contrariando a velha tradição soviética, e o senso comum, de apostar sempre na força bruta para compensar a falta de tecnologia, o 6282 foi projectado com muito refinamento. Em vez das baratas, mas obsoletas, pesadas e volumosas baterias tracionárias de chumbo, ou as já tradicionais íons de lítio com sua boa relação custo/benefício, se valem das caras e eficientes baterias de titanato de lítio, as mesmas usadas pela Rimac. Embora sejam pacotes pequenos, que garantem não mais do que 70km de autonomia, eles justificam seu preço pela enorme capacidade de carga e descarga, podendo ir de 0 a 100% de carga em até quinze minutos, com a recarga podendo ser feita por via aérea, como nos trólebus; ou seja, eles podem rodar virtualmente para sempre. A parte mais inteligente foi utilizar pequenas porções do que há de melhor e valer-se de uma infraestrutura invejável para garantir que seja o suficiente, assim eles reduziram significativamente os custos e garantiram tanto a comodidade dos usuários quanto a longa vida útil do conjunto. Tudo isso em cima de um veículo de piso baixo, o sonho de todos os brasileiros sem carro próprio.

 


            É notável citar que essas montadoras são russas. Embora certamente haja influência tecnológica externa, simplesmente porque nada no mundo pode mais ser feito absolutamente sozinho, tudo foi desenvolvido lá dentro, e o 6282 não é o único modelo eléctrico deles. Em resumo, eles não dependem de países inimigos, ou falsos amigos, para fabricarem o que precisam. A capacidade manufatureira está em solo russo. Eles até podem importar, mas se for necessário fabricam até as telas sensíveis ao toque… ou até mesmo as baterias, já que a Rússia tem as maiores reservas de titânio do mundo… assim como o Brasil tem as maiores de nióbio… preciso desenhar?

 


            E foi assim, em silêncio, tendo apenas a imprensa especializada mais atenta por perto, que Moscou fez sozinha e em larga escala, o que os gritadores ecofinanceiros e os ideólogos neopentecostais não conseguem juntos com sua arrogância pseudo-humanitária.

Mais a respeito aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

A Namíbia é bem mais do que vocês pensam

 


            As pessoas na América e especialmente na Europa, porque é vizinha continental, têm uma visão muito deturpada da África, e nossa imprensa ajuda muito a atrapalhar. Esquecendo-se de que Egito, Marrocos, África do Sul e outros países bem mais desenvolvidos do que pensam estão lá, vendem unicamente a imagem daquele bebê que se rende à fome para ser devorado por abutres; e aquele bebê, para seu governo, sobreviveu. Uma busca por arquitetura e cinema na África já refresca muito as idéias, e dilapida seus preconceitos contra os africanos... e é claro que eu vou arrancar mais uma lasca. Sim, os africanos também dirigem carros eléctricos, clique aqui e aqui, e veja.



            Vamos à Namíbia, que para vocês pode ser um dos países mais insuspeitos para constar neste blog, mas que já tem uma empresa tecnológica (das tais start-ups) especializada em conversão veicular para tração eléctrica. E não se trata de gambiarra em que se usa o bloco do motor original como suporte para o eléctrico, baterias de carro que perdem a confiabilidade se debitarem mais de um terço da carga ou coisas assim. Utilizaram em uma valente Toyota Land Cruiser, descendente de nossa indestrutível Bandeirante, baterias de lítio-fosfato de ferro e um motor apropriadamente adaptado ao veículo batizado de e-Cruiser... não, não é dos mais criativos, mas o foco foi na funcionalidade. Como tudo o que é bem feito, não saiu barato, a conversão custou 35.000 Euros.

Axel Conrad e Madryn Cosburn, os pais da empreitada com seu e-Cruiser. Photo de Lisa Plank

            O pacote conta com razoáveis 28,8kW de baterias LiFePo4, que alimentam o motor de 45kW (61,2cv) e a picape roda de 80 a 100km com uma carga. Pouco para o uso moderno de um plug-in, mas suficiente para o uso urbano corporativo, ou até breves incursões nas savanas, em que o alto torque e a baixa velocidade constante deixam a e-Cruiser à vontade; trechos quase intransponíveis e nenhuma exigência de desempenho sempre foram o habitat da linhagem da Land Cruiser. Por fora só discretas faixas brancas com "e-Cruiser" e o logo inscritos chamam atenção, que nem é tanta atenção assim, sinalizando que a proposta ´[e séria e que haverá evolução, ao contrário de pirotecnias típicas de empresas caroneiras. Eles querem crescer.

            O projecto foi tão bem feito e bem executado, que foi notícia em praticamente todos os meios de comunicação da África, mas é claro que não veremos isso nos canais dos preconceituosos combatentes do preconceito. Aliás, a população negra não rejeitou o projecto só porque foi concebido e está sendo tocado por brancos. O preconceito, inclusive contra os eléctricos, é muito maior deste lado da cerca.

            Ver mais aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e o site da Electric Vehicles aqui. O facebook deles aqui.



quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Asas híbridas... pelo menos no chão

 

O 747-800 usado como cobaia para test-drive

            Pouca gente sabe, mas nossa saudosa Romi Isetta não tinha engrenagens para marcha ré, e nem por isso o motorista precisava descer e empurrar o ovinho para manobrar. A ré era feita pelo motor de partida, ou seja, há mais de sessenta anos nós tivemos um híbrido (extremamente) leve. Por ser um uso curto e esporádico, isso não acarretava danos ao motor de partida, que por sua concepção não deve ser usado prolongadamente. A extrema leveza do veículo permitia isso, já em carros grande e pesados como os de hoje, seria preciso algo bem mais potente. Agora imaginem um motorzinho de manobra em um veículo de até 80 toneladas... mais especificamente um avião de passageiros...


            A Wheeltug fez isso. utilizou-se dessa idéia simples para lançar no mercado um trem de pouso com motor próprio para dispensar os tratores pushtrack, ou gastos exorbitantes de caro querosene de aviação para dar ré, manobrar e levar a aeronave de forma ensurdecedora até a cabeceira da pista, para decolagem. Mas qual o problema com os veículos de reboque, para que esse equipamento novo compense; lembrando que tudo em aeronáutica é muito caro? Além de quase todos serem a combustão interna? Vamos lá.


  • Apesar de parecerem simples, são veículos de baixa escala de produção, portanto são relativamente caros, o que inclui eventuais reparos que uma época de festa (excetuando-se esta da pandemia, claro) pode tornar desagradavelmente freqüente;
  • Virtualmente NENHUM aeroporto no mundo tem um para cada avião em solo, e haja estrutura física e pessoal para operar e preservar uma frota assim. Isso significa que em momentos de maior movimento, vôos com circunflexo podem atrasar pura e simplesmente por falta de um pushtrack ou outro tipo de veículo de taxiamento disponível em tempo hábil;
  • A maioria usa barras de tração ligadas ao trem de pouso dianteiro para manobrar os aviões. Dependendo do tipo de avião que o aeroporto for capaz de receber, o empurra-e-puxa gera tensões absurdas nessa barra e em seus engates, por isso mesmo as quebras não são raras, ocasionando mais atrasos e mais custos, que agora se estendem aos outros vôos, por haver um veículo de manobra a menos disponível;
  • Já disse que a maioria é a combustão, isso gera o mesmo problema sofrido pelas barras de tração, ou mesmo engate embutido no caso dos mais modernos. Ainda há o problema da poluição em um ambiente altamente poluído, porque o combustível de aviação não segue, ainda, as rígidas leis ambientais vigentes.


Simplificadamente, é isto


            Basicamente é isso. A economia esperada seria um bom argumento, que compensaria um eventual peso não pago no avião. Não há qualquer detalhe importante divulgado ao público, certamente porque é um producto caro e altamente dirigido, mas o que se divulgou é surpreendente e altamente vantajoso. Todo o conjunto pesa menos de 150kg, incluindo motor, sinalizadores, fiação, câmera para o piloto se orientar, controle e periféricos, graças ao uso de titânio, em vez de aço de alta liga... e isso faz pensar que é realmente muito caro, tanto quanto pouco útil para o uso de um cidadão comum. Sim, dá para fazer um híbrido leve, só para manobras, mas os custos disso para um avião de carreira são comparativamente muito menores.


            Jatos mais populares, como o Boeing 737-800 e o Airbus A320 são a clientela mais visada a receber os benefícios. Estima-se que a economia possa chegar a US$ 7.000.000 por ano, por cada aeronave. Fora a economia de tempo, que permitiria à aeronave fazer mais vôos, deixaria o passageiro mais feliz e melhoraria a imagem da empresa; mais lucratividade em todos os sentidos. Considerando que não é difícil uma companhia ter mais de cem aviões, e cada um desse porte custar cerca de US$ 200.000.000, a economia conseguida compraria três ou quatro aviões novos à vista, todos os anos. Acontece que o consumo de um avião não é medido em quilômetros por litro, é em toneladas por hora... Não consegui nada sobre as baterias, que também não devem ser das mais baratas, mas haja potência instalada para mover oitenta toneladas!


            Como tudo na aviação comercial, ainda faltam etapas. Homologar e colocar à venda, como acontece com os veículos terrestres, é um simplismo inadmissível na areonáutica. O Wheeltug ainda precisa de certificação nos órgãos competentes de gestão aeroportuária, é uma para cada modelo de avião cuja companhia se interessar. ou seja, Ainda vai demorar algum tempo até esse alívio no bolso e nos ouvidos se juntar ao ar mais respirável nos aeroportos, mas isso é coisas a que as empresas ligadas à aviação estão acostumadas, e para o que precisam ter capital de giro. O certo é que quando a certificação for emitida, as experiências de voar e de fornecer vôo serão muito mais agradáveis, inclusive para quem não embarcar.

É hora de dizer tchau! É hora de dizer tchau!


            Os aviões maiores terão que esperar, o que dará sobrevida aos pushtracks e taxi bots, mas seu processo de extinção é certo; não é se, é quando.


Ver mais aqui, aqui, aqui e o site da WheelTug aqui.

terça-feira, 25 de agosto de 2020

Gente que converte - Youtubers úteis

 

 Geo Metro 1995

           Diante da deprimente escalada com que a imprensa especializada dá importância e cartaz a celebritubers idiotas, e não me darei o trabalho de colocar links para dar mais publicidade a esses protozoários bípedes, tratei de procurar alguns youtubers úteis e selecionei três com afinidades de tópico com o À Bateria. Não me furtando o direito de apresentar boas gambiarras, me ative às que não põe nossas vidas em risco, bem como projectos que apesar de não serem baratos, custam menos do que um rim. Recomendo mesmo aos que entendem inglês a activar as legendas, porque não é o único idioma que vocês vão encontrar. Já adianto uma coisa, motor de furadeira serve sim para fazer o serviço, mas não daquelas pequenininhas portáteis, com poucos watts de potência, dificilmente uma suporta o severo uso automotivo.

 

            Também uso esses exemplos, dois deles brasileiros, para encorajar a cultura de conversão no Brasil; afinal tem gente que gasta cem mil bolsos para encher o carro de som e infernizar a vida alheia, o que são então cinqüenta mil para converter um carro que poderia estar a caminho do ferro-velho, só porque o motor não funciona mais e um novo é mais caro do que o carro? E o Brasil foi inundado com esses carros de mecânica descartável, que são jogados ao desmanche com seus monoblocos ainda íntegros e longevos. Um Kia Clarus dos anos 1990, por exemplo, se pifar, é colocar um motor GM ou jogar fora, não vai encontrar peças se a parte eléctrica for danificada, enfim... São milhares de carros pelo país que se candidatariam com força à conversão. Os carros dos anos 1990, ainda em desprestígio por estarem "velhos" são sempre os melhores candidatos.

 

            Começo com o pitoresco CreativeScience que mostra projectos simples e bem práticos de fazer, como patinetes e pequenos veículos adaptados. A tônica do canal é experimentação e aprendizado com tentativa e erro, que o simpático indiano repassa ao espectador. É tudo muito simples, lúdico e com potencial para reverter o estrago que radicais ecoxaropes fizeram na idéia da mobilidade eletrificada. Provar que não precisa ter uma fortuna para fazer algo decente é o foco. O uso de hubmotors é extensivo e ajuda na redução de custos. Por que gastar o preço de uma CG num scooter de baixíssimo desempenho e curta autonomia, se uma boa bicicleta convertida pode dar conta do recado? Às vezes (como aqui) a mão de fazer gambiarra treme forte.

 

            Bemjamin Nelson é mais amplo e sofiscicado, com conteúdo de alto nível, se dando o luxo de fazer testes com veículos eléctricos e convertidos; ele tem um gosto especial por conversão de tratores antigos (como este) e de jardim, mas tem vídeos de conversões de carros, motos e picapes. Os testes incluem inclusive a durabilidade e confiabilidade de carregadores e baterias, também de reparos como os de um Chevrolet Volt acidentado. Cutucar a Tesla faz parte do passatempo. A maioria dos vídeos não é longa, ele chega a dividir o assunto em episódios, mas mostra tudo o que importa para o espectador saber o que deve ou não fazer.

 

            Jeff’s Projects tem, se comparado aos demais, poucos vídeos, mas imprime sua personalidade com conversões de carros e reaproveitamentos de componentes. A recuperação e conversão de clássicos é o seu forte, inclusive um Panzer Mercedes-Benz 220 e um MG TF, ambos com mecânicas originais conhecidamente caras caras e peças difíceis de conseguir; e custam os olhos da cara. Ele explica com leveza o que e porque fez, às vezes quase desenhando. As soluções que mostra não são definitivas e nem sempre as mais estéticas, mas mostra a validade de não esperar ter o melhor e mais bonito para fazer algo que funciona e resolve os seus problemas: Funcionou? É seguro? Então vá em frente!

 

            EV Mania é antigo, sediado na Índia já foi (não sei se ainda o tem) um blog sobre carros eléctricos, e por isso mesmo um sobrevivente do boom de canais que pipocaram sem critério, no início do renascimento dos carros eléctricos. Vídeos de comparativos, testes, novos productos e explicações sobre novas tecnologias fazem o diferencial do canal. Há inclusive um comparativo que no contexto geopolítico de hoje soa como provocação, entre um motor indiano e um chinês… Pois é, a Índia também fabrica essas coisas, e bem mais confiáveis, mas quem tem cartaz é a ditadura… O óbvio ululante é posto diante de nossos olhos. Senhores, escolham suas tretas! Para quem está iniciando nesta senda e quer saber que bagunça é essa, é um dos primeiros canais que recomendo.

 

            Higher Voltage é da nova geração, embora não da última. Até o fechamento deste artigo (me metendo a jornalista de portal) havia apenas doze vídeos, mas que compensam o investimento de tempo. Em dois deles, o titular mostra a conversão de uma respeitável Honda Sabre para o desespero dos adoradores de amputação de escapamento, explicando com cuidado e paciência o que foi feito. O pouco material é, entretanto, digno de um documentário, porque ele ensina mesmo o que foi feito.

 

            Ebikes School cujo titular mais se parece com um irmão perdido dos Bee Gees,é o que o nome diz, mais direcionado às motocicletas, mas tudo o que eles ensinam pode ser adaptado aos automóveis. A videoteca não é muito extensa, ainda mais se considerar que o vídeo mais antigo tem cinco anos, o que não é demérito, a solidez do conhecimento e a simplicidade com que o expõe são seus diferenciais, ele ensina inclusive a produzir baterias tracionárias a partir de simples pilhas recarregáveis; incluindo aí métodos seguros, testes e instalação. Claro que há também as conversões, tanto de bicicletas quanto das motocicletas, e no último vídeo (https://www.youtube.com/watch?v=ACcMP2fTYAM) há explicações técnicas simplificadas sobre os jargões do nosso meio; ele tamém faz um comprativo entre motores para conversão. Tudo é feito compropriedade e sem complicações, ele tem até livros escritos a respeito, como este.

 

            Electric MotoVlog é um canal altamente especializado… em uma só motocicleta, a do titular. Uma bruta Yamaha Genesis que impõe respeito, sua conversão foi desenvolvida entre sete e quatro anos atrás, data do último vídeo. O maior mérito dessa especialização é ele ter resolvido, ao longo de quatro anos, praticamente todos os problemas resultantes da conversão. Todo o processo é explicado em detalhes e as soluções explicadas com a paciência que ele precisou ter. Pode-se dizer que ele praticamente desenvolveu uma motocicleta nova, cujas soluções encontradas a Yamaha poderia aproveitar.

 

            Para não dizer que não temos exemplos latinos, consegui encontrar três canais dedicados ao tópico, dois deles nossos compatriotas:

 

            O mexicano Oscar Garcia dá sua valiosa contribuição com conversões de vários veículos, usando de técnicas simples e confiáveis, mas de relativamente baixo custo, encorajando os empreendedores ainda temerosos pelo que os outros pensariam. Ele vai fundo nas explicações, mas não delonga e não nos enfada com tagarelices típicas de “youtubers”, indo directo à prática quando o conteúdo já tiver sido passado, e às vezes a prática é autoexplicativa. Os passeios com seus convertidos são o momento de leveza de cada vídeo. O uso de baterias de chumbo é típico desse baixo custo, apesar das limitações de desempenho e autonomia, mas para o percurso casa-trabalho-casa pode ser suficiente. O tipo de gente que ajuda a evitar que seu país afunde de vez no terceiro mundo, e que faria a imigração americana rever suas restrições, se fosse maioria.

 

            Klaus Fernandes é um dos que representam bem o Brasil. O jeito maneiro e paciente de falar entrega seu gentílico, bem como as soluções de baixo custo, mas não de baixa segurança. Iniciou há dois anos e ainda trabalha explicando o bê-á-bá da conversão automotiva, incluindo a montagem de uma boa bateria caseira de íons de lítio, usando as pequenas pilhas avulsas que inundam o mercado. A humildade para deixar claro que ainda está aprendendo e a disponibilidade pra esclarecer dúvidas, são pontos positivos difíceis de encontrar. O longo passeio feito no carro um Effa M100 ainda em desenvolvimento, mas já funcional, comprova que ele sabe o que está fazendo. A máxima foi de cerca de 80km/h, o suficiente para pegar a estrada e sobra para a cidade... e ninguém anda mais do que isso com um Effa. Sim, ele poderia ter escolhido uma minivan Mercedes-benz classe A, que tem infinitas vantagens de espaço e fiabilidade estrutural, mas como eu já disse sobre os Mercedes é caro e difícil encontrar peças originais da marca, além de o próprio modelo ainda ser bastante valorizado, com clubes e tudo mais pelo país… mas para quem tiver bala, fique à vontade...

 

            Por último temos o Francisco que se dedicou a desarmar a bomba, digo, a converter um Fiat Brava do melhor modo que pôde, explicado em cinco vídeos ao longo de sete extensos anos. De início tinha escassos 20km de autonomia com baterias de chumbo, depois 70km usando as de íons de lítio (para vocês verem o quanto a diferença de rendimento é desproporcionalmente maior do que o aumento do preço) de então até agora o desenvolvimento não parou. Aliás, é este mesmo o espírito da coisa, tornar o carro um laboratório ambulante e funcional, para que o próprio uso normal ajude a pagar as salgadas despesas desse tipo de empreendimento.

 

            Estes são apenas alguns exemplos de youtubers que salvam a combalida reputação do termo. Há muitos mais canais e eu me ative ao “faça você mesmo” das conversões, mas eles aparecerão à medida que vocês forem se aprofundando na electropeia, mostrando ao robô do Youtube o que querem ver. Então quem ficou de fora não precisa tacar pedras em mim, fiz uma seleção muito restrita em um assunto que costuma ser tratado quase como marginal, por causa de adaptações descriteriosas e mal feitas. Aqui vemos o lado bom da coisa.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Gravata não é diploma de engenharia!




            Mais uma vez a idiotice dos discursos rasos e inflamados me obriga a ser advogado do diabo. Uma alegada boa intenção (aham… Para cima de mim? Faz favor) de um leigo pode pôr em risco não só os esforços para a popularização da mobilidade eléctrica, como também a liberdade mais básica do consumidor, que é decidir o que quer ou não comprar.





            Certa feita, um parlamentar idiota europeu propôs extinguir imediatamente os carros a combustão, trocando todos por versões eléctricas. Os utopistas aplaudiram, mas a Volkswagen logo puxou o parlamento de volta ao mundo real cobrando dados e fontes de recursos, afirmando ainda que eles estariam assim dando os empregos europeus para os chineses, que seriam os únicos com capacidade instalada para alimentar a demanda por baterias… e talvez não conseguissem, o que elevaria os preços destas, encarecendo os carros por conseqüência. Mas a argumentação de quem entende do assunto não demoveu os intelectuais de ar-condicionado, que NUNCA põe a cara a tapa em testes científicos reais, eles não desistem de arruinar a civilização que dizem querer salvar.





            O mais recente pateta engravatado, que leu artigos ufanistas sem embasamento técnico (ver aqui) é brasileiro. De cara ele propõe PROIBIR a venda de carros a gasolina e diesel no Brasil em dez anos, isso incluiria híbridos. Lhes parece ser muito tempo? Pois desenvolver um modelo totalmente novo pode levar cinco anos, e outros tantos para ele se pagar. A alegação do indivíduo votado é que temos tecnologia de biocombustível e plug-in para colocar em prática, o que só reforça o quanto seu conhecimento de causa é raso e restrito. Vamos a uma lição rápida de economia: As regras de emissões e segurança encareceram muito tanto o desenvolvimento quanto a produção e a manutenção dos carros, piora o facto de os custos dos testes e adequações serem proporcionalmente mais perversos com os carros populares, que têm pouco por onde absorver esse encarecimento, não preciso explicar muito para vocês perceberem que os carros de luxo, para os quais tudo isso é proporcionalmente mais barato, sentem pouco ou quase nada esse peso extra.




            Aliás, peso é outro problema, junto com a redução do espaço interno. Isso obriga os fabricantes a usarem motores mais potentes em carros que normalmente não precisariam deles, o que piora mais os índices de consumo e aumenta os custos para equacionar tudo. Não bastasse essa fase, que encarece a venda ao consumidor, são incontáveis componentes que falharão cedo ou tarde e aumentarão os custos de manutenção, principalmente porque alguns têm validade, como os detonadores de airbag, este que está na longa lista de peças que simplesmente NÃO PODEM SER CONSERTADAS. Ou seja, cumprida sua função, todo o conjunto precisa ser TROCADO. E são muitas vezes peças frágeis. Em um carro grande e caro isso já seria um problema, imaginem em um popular com suas restrições de espaço e capacidade de carga, dificultando o trabalho dos mecânicos, estes que precisam ser especializados; mão de obra especializada é sempre mais cara.




            Um carro popular, para ser competitivo, precisa ter sua produção estimada em milhões de unidades, antes da primeira reestilização, para que o volume pague os custos de desenvolvimento, a manutenção da linha de montagem e os dividendos sem que a margem de lucro seja exorbitante. Um carro de luxo é bem mais caro para ser produzido, mas umas poucas milhares de unidades podem bastar para que o projecto se pague. A solução então é exportar, porque dificilmente um mercado local daria conta de todos os custos, isso incluindo o chinês. O problema aqui é que para termos carros exclusivamente a combustíveis vegetais, seria preciso desenvolver uma linha de motores, sistemas de alimentação, tanques, filtros, catalisadores e talvez até versões EXCLUSIVAS para exportar e outras para venda doméstica; mais testes, mais burocracia, mais tempo e mais custos para absorver. No final das contas, seriam dois carros distintos, um para o mercado interno e um para exportação, com custos proporcionalmente maiores, que nenhum mercado no mundo aceitaria custear. Preciso pormenorizar para vocês entenderem que os mais pobres seriam literalmente privados de ter o carro próprio?




            Rapidamente: O que mantém os custos de produção e manutenção sob controle é justo a padronização, inclusive o facto de um mesmo motor poder ser utilizado em vários países com pouca ou nenhuma modificação, o que permite que todo o restante do conjunto possa ser praticamente o mesmo em vários países. Isso também permite que a mão de obra utilizada não seja muito mal paga, a fim de manter da qualidade da montagem. O ferramental pode ser praticamente o mesmo para várias plantas fabris, com desenhos de matrizes padronizados, o que reduz muito os prazos e os custos. A época dos carros baratinhos feitos à mão, acabou. Se não houver uma revolução na arquitetura dos automóveis, carros com produção prevista para menos de um milhão de unidades continuarão a ser inacessíveis à maioria. Outro efeito colateral é que os preços dos carros usados seriam hiperinflacionados, porque a procura aumentaria exponencialmente para modelos que simplesmente não são mais produzidos, e por isso não podem ser repostos… o crime organizado adoraria ter mais esse filão. Os custos para se modificar TODA a cadeia produtiva seriam proibitivos, os fabricantes menores e alguns grandes fechariam as portas, gerando desemprego e recessão sem precedentes, a não ser que alguém pagasse a conta, e quem propõe um projecto de lei raso como esse, NUNCA pensa em como ou quem vai pagar a conta, só em receber os dividendos políticos de sua base eleitoral. Entendido? Então vamos à próxima fase do texto…




            No tocante aos carros eléctricos, há décadas eu acompanho de perto a evolução assombrosa das técnicas e das reduções de custos. A arquitetura de um carro eléctrico é MUITO mais simples, é basicamente um motor eléctrico com algumas baterias e um reostato ligado ao controlador; um carro a combustão mais simples é barroco, se comparado a isso. Essa simplicidade franciscana aliada à rápida evolução das baterias, permite que um carro eléctrico médio custe menos do que um sedã grande de alto luxo, mas ainda assim é muito mais caro do que seu par a combustão interna. Hoje os fabricantes compram pacotes de baterias de íons de lítio ou phosphato de lítio por US$1000,00 ou menos por KW. Para ter um desempenho bom, longe de ser brilhante, um carro médio familiar precisa de no mínimo 40kw, para que possa fazer pequenas viagens a velocidades médias razoáveis, ou rodar o dia inteiro por uma região metropolitana sem o risco de parar por falta de energia, e sem precisar andar sempre à direita… onde houver pista da direita. Mas não é só isso, as baterias não podem ficar soltas pelo assoalho ou porta-malas, seria como colocar o combustível em um saco de lixo dentro do carro. Há de se ter uma estrutura para manter todas as pilhas da bateria unidas, estáveis e protegidas, se for o caso até mesmo refrigeradas.



            E nem venham me falar em placas solares! Elas ainda são caras, pesadas e demasiadamente frágeis para uso automotivo, e rendem pouco! As melhores e mais caras entregam cerca de 200wh/m²; isso é muito pouco! O teto de uma Kombi não conseguiria em rezando, mais do que 1kw, o que não daria nem para 30km/h com o sol a pino e o carro vazio.






           Ainda no tocante à estrutura, simplificadamente, vamos nos lembrar de que essas pilhas são compostas de metais. Mesmo o lítio sendo o metal mais leve na natureza, ainda é um metal e usa estrutura metálica para ser adequadamente armazenado; a bateria em si não pesa mais do que 800g/litro, mas ela sozinha não basta, precisa de fiação de transmissão,  contenção e estrutura de resistência, se usar o alumínio temos 2,7kg/litro; um conjunto que pese menos de 1kg/litro é muito leve. Um litro de gasolina das boas, sem misturas, não passa de 775g, e sendo líquida ela pode ser acomodada em qualquer cantinho de um tanque plástico amorfo, para optimizar o espaço interno. Com tudo isso, vamos à triste realidade! 40kw não dão mais do que 300km em um carro leve e bem calibrado, distância que um caro de a combustão de porte razoável percorre com menos de 15 litros de gasolina; façam as contas de massa e custos de produção e verão o quão longe ainda estamos de uma realidade majoritariamente à bateria.




            Há uma diferença muito grande entre fazer um carro em casa para uso próprio, e homologar um modelo para produção industrial. As exigências para fabricar um carro em larga escala não podem ser atendidas pelo cidadão comum, mesmo pelos mais ricos. Ainda que quase todos os componentes sejam de veículos já existentes, testar e destruir protótipos em ensaios de segurança e durabilidade exige uma estrutura gigantesca, com grande fartura de mão de obra altamente especializada, por vários anos, e ainda assim há o risco de se ter que jogar tudo fora e recomeçar do zero. Estou falando em centenas de milhões de dólares com retorno incerto, muito diferente de um técnico que sabe que não terá retorno financeiro de sua empreitada, que não gastará com publicidade e não será processado por falhas de montagem e recalls. Pegar um velho Opala com motor fundido e encher de baterias (roubando espaço precioso no porta-malas) não vai lhe causar problemas de rejeição do consumidor, mas a GM nem pode sonhar em fazer isso com o Cruze, se seu público não se declarar receptivo e disposto a pagar por isso… nem sonhando!