George Bye, from Forbes |
O que deu popularidade
ao carro eléctrico foi justamente o abandono das idéias utópicas de minicarros
pelados, lerdos e com alcance insuficiente para as necessidades de uma família.
Com todos os avanços que já tivemos, as baterias ainda são caras, pesadas e
volumosas, características que só podem ser balanceadas a contento por veículos
maiores, mas potentes e bem equipados; bom senso inaugurado pela Tesla e levada
a termo por outras montadoras. Com os outros modais nãos seria diferente, em
verdade é até mais dramático. Ferrovias demandam veículos extremamente potentes
para percursos extremamente longos, puxando cargas extremamente pesadas.
Hidrovias têm o agravante de não haver pontos de recarga e não haver
possibilidade de electrificar trechos do oceano para mitigar o problema.
Aerovias têm o ônus extra de que aviões sem anergia caem, simples assim. É por isso
que não vemos um Boeing 747 com seis ou oito motores a hélice recarregando
baterias no hangar de algum aeroporto, mas nem por isso outros modais estão
parados no tempo. No caso da indústria aeronáutica os passos só são mais curtos
do que a da automotiva. Além das iniciativas ousadas da Pipstrel, outras
empresas estão trabalhando a sério e a americana Bye Aerospace buscou a maneira
mais racional de concretizar a aviação executiva.
eFlyer 800 |
Usando a consagrada
fuselagem do robusto bimotor King Air 260 para produzir o eFlyer 800, após se
capitalizar e ganhar expertise com o pequenino e austero e-Flyer 2, todos os
meios sérios de comunicação aeronáutica deram espaço à obra de George Bye. Os
resultados são animadores, com cerca de 518 km/h de velocidade de cruzeiro e
926 km de alcance, mais 45 minutos de reserva; este é um padrão de segurança na
aviação mundial. São quase duas horas de vôo a uma velocidade razoável para
cobrir médias distâncias, que é o mais comum na aviação executiva. O problema
de recarga continua, não dá para simplesmente fazer escalas de alguns minutos
para reabastecer e cruzar os Estados Unidos em um dia. Seria planejar bem para
chegar ao destino com uma boa carga de reserva, a fim de reduzir o tempo de
recarga; mas marcar a reunião para a tarde e seguir viagem de manhã bem cedo
ainda estaria em um bom plano de vôo. Para o empuxo são previstos de 50kW a
500kW, mas podem chegar a 1MW (1.360.000cv) de potência nos motores ENGYNeUS
fornecidos pela Safran Electrical & Power. A altitude de 35.000 pés, pouco
mais de 11km, não afetaria o funcionamento dos motores eléctricos, então a
economia do ar rarefeito seria somada ao funcionamento inalterado do trem de
força.
eFlyer 800 |
As grandes vantagens,
entretanto, podem seduzir executivos que podem abrir mão de longos alcances e
se dispõe a, eventualmente, fazer parte do trajeto emergencialmente com
querosene. Pelo silêncio de seus motores, o eFlyer 800 pode sobrevoar áreas que
um bimotor desse porte não poderia, em altitudes menos concorridas, agilizando
as aterrissagens. Também por conta do silêncio, poderia utilizar essas mesmas
rotas a qualquer hora da noite, sem que a vizinhança do aeroporto encomende um
míssil terra-ar. Apesar de ser aconselhável ter um carregador apropriado, ainda
seria possível deixar o avião a uma tomada de alta corrente, dispensando
contractos com empresas de abastecimento e sem medo de querosene ruim
prejudicar o desempenho. O único ruído seria o aerodinâmico que, asseguro, é
uma fração do nível de ruído produzido por uma aeronave a combustão interna,
isso o habilitaria a trabalhar até mesmo em uma eventual pista interna de um
hospital. Já pensaram, sair directo da UTI aérea para a sala de cirurgia, sem
translado terrestre e sem o risco de ficar preso no trânsito? Sem contar as
vantagens da gritante simplicidade construtiva, que veremos a seguir.
King Air 260c ambulância aérea |
O baixíssimo custo
comparativo de manutenção pode compensar em muito o relativo baixo alcance e a
notória demora para recarga de baterias tão potentes. Os padrões aeronáuticos
de segurança demandam rotinas de manutenção severas e vistorias, que fariam o
mais chato zé frizinho parecer um mecânico boca de porco. Todos os itens
precisam ser checados não apenas diariamente, mas sempre antes de cada
decolagem. Imagine abrir o capô de seu carro e vistoriar óleo, fluido
refrigerante, fluido de freios e tensão das polias; depois olhar em baixo para
verificar o estado dos eixos, pneus e sistema de escapamento; por fim girar a
chave e verificar o funcionamento dinâmico te todos os sistemas para só então
dar a partida e sair com o carro. Pois pilotos fazem isso com os aviões. Agora
imagine a agilidade para decolagem, se o catatau de procedimentos for reduzido
a algumas poucas páginas até mais simples de serem checadas. Poupar-se ia muito
tempo, que com as menores restrições compensaria em parte a menor velocidade de
cruzeiro.
King Air 260 e uma Renault Master, que seria dispensável |
Na hora de fazer as revisões, a parte de empuxo seria quase brincadeira; apenas hélices, estatores, rotores, fiação e baterias! E o próprio processo de recarga daria aos mecânicos as condições gerais da alimentação. O avião voltaria aos céus muito rapidamente. O que pode levar semanas, dependendo do caso, poderia durar poucos dias, talvez nem isso. Então paga-se menos horas de manutenção, menos taxas de hangaragem, pagando-se menos por fretamento de aeronaves durante essa manutenção, enfim, uma lista interminável de contratempos e aborrecimentos aos quais os proprietários de aviões executivos estão expostos. Então vocês podem imaginar, e imaginariam certo, que aviões próprios poupam ao cidadão muito mais do que custam para comprar e manter. Se tu voas mais de vinte e cinco horas por mês, já pode cogitar a compra ou ao menos arrendamento de uma aeronave; o eFlyer 800 promete reduzir essa relação.
eFlyer 800 |
eFlyer 2 |
Ainda há a escolha das
baterias de lítio-enxofre como bônus. Embora caras, têm uma densidade
energética de menos de 2 kg/kW. Também pesa o facto de o enxofre ser muito
abundante, o que torna o eFlyer 800 menos vulnerável aos problemas já aventados
do encarecimento das baterias, pelo excesso de demanda que está porvir. Sim,
infelizmente a euforia e a cegueira ideológica ameaçam comprometer o
desenvolvimento do mercado de plug-ins, e por isso mesmo decidi tratá-los
explicitamente como uma excelente OPÇÃO de mobilidade e não como a salvação da
humanidade, como os outros sites têm feito. Enfim, essas baterias são
fornecidas pela britânica Oxis Energy, o que também é uma excelente notícia, as
distâncias menores simplificam a logística do abastecimento e, principalmente,
ser uma empresa sediada na Grã-Bretanha afasta boa parte dos fantasmas do
desabastecimento, não só por conta da superdemanda que desponta no horizonte,
mas também porque americanos e britânicos se entendem bem e não haverá
represálias políticas e ideológicas à Bye Aerospace por divergências entre
Biden e Johnson. Doravente a geopolítica deve ser considerada em qualquer
empreendimento, e este tipo é dos mais vulneráveis.
Pode por 50MW, por favor |
Para a aviação
comercial regular ainda não há chances, mas quem sabe o desenvolvimento e a boa
aceitação não incentiva a hibridação dos grandes jactos comerciais, e assim
talvez possamos vê-los com um cabo na tomada enquanto os tanques são
abastecidos; e quem sabe isso salva os garbosos quadrijatos, especialmente sua
majestade dos ares, o Being 747… Boa sorte à iniciativa de Denver.
Site da Bye Aerospace
Site da Safran
Site da Oxis
Mais notícias aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
Um vídeo rápido sobre o eFlyer 800:
Considerando que o fan de um motor turbofan moderno é conceitualmente uma espécie de hélice carenada, e que alguns já incorporam caixa de redução para as pontas das palhetas do fan manterem a velocidade subsônica, a hibridização me parece mais plausível. Um esquema análogo ao HSD da Toyota seria útil para promover a redução e também a geração on-board de energia elétrica para aviônicos e outros dispositivos a bordo, além de eventualmente permitir também um efeito análogo ao da frenagem regenerativa ao invés de depender somente do reverso e dos freios. E uma força auxiliar elétrica durante as decolagens também poderia diminuir o consumo de combustível nesse momento tão crítico.
ResponderExcluirFora que o motor eléctrico tem alta eficiência em amplas faixas de rotação e acelera muito mais rápido do que uma turbina.
ExcluirConsiderando que na aviação militar é mais comum o uso de starters elétricos ao invés de pneumáticos como hoje é mais comum na aviação comercial, já é outro ponto que favoreceria uma hipotética hibridização. E vale destacar que a maior rapidez da partida elétrica em comparação a sistemas de partida pneumáticos é valorizada pelos militares em função da prontidão. No tocante à aviação civil, talvez ainda seja o caso de considerar que um sistema híbrido já viabilizaria recorrer a uma configuração análoga ao HSD também de modo a reduzir a quantidade de acessórios a serem acionados por um motor turboélice ou turbofan de acordo com a aplicação.
ExcluirSão coisas que a aviação civil não necessitava até agora, mas as coisas mudaram.
ExcluirAs possibilidades estão postas à mesa. E obviamente, além daquela questão das emissões, se houver a chance de diminuir os custos de manutenção e a despesa com o combustível, e o impacto sobre o preço de um avião ou do leasing for facilmente amortizável ao longo da vida útil operacional, não dá para negar as chances de um sistema híbrido dar certo.
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